Identificar populações ameaçadas e quantificar sua vulnerabilidade é crucial para estabelecer prioridades de conservação e fornecer informações robustas para a tomada de decisões. O golfinho-de-Lahille (Tursiops gephyreus) ocorre em números baixos e está restrito às águas costeiras do Atlântico Sul Ocidental, do sul do Brasil à Argentina. As estimativas de abundância sugerem um tamanho populacional máximo de 600 indivíduos e a espécie é considerada vulnerável à extinção de acordo com os critérios da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN). Devido à sua distribuição muito costeira, o golfinho-de-Lahille há muito está sujeito à mortalidade por captura acidental na pesca com redes de emalhar em águas costeiras do sul do Brasil.

Pesquisadores do Laboratório de Ecologia e Conservação da Megafauna Marinha (ECOMEGA) acabam de publicar o artigo científico intitulado "Dynamics and viability of a small, estuarine-resident population of Lahille's bottlenose dolphins from Southern Brazil". Este artigo fez parte da tese de doutorado de Pedro Fruet, no Programa de Pós-Graduação em Oceanografia Biológica da Universidade Federal do Rio Grande-FURG, Brasil, sob orientação dos Professores Eduardo Secchi (FURG) e Luciana Möller (Flinders University, Austrália) em regime de cotutela com dupla diplomação. A Flinders University concedeu uma isenção de taxas escolares como contrapartida do acordo de cotutela entre esta universidade e a FURG. Este acordo está alinhado aos objetivos do Projeto PrInt/FURG, no âmbito do Programa Capes PrInt (edital 041/2017). O estudo recebeu apoio financeiro da Organização Não-Governamental Alemã YAQU PACHA e também foi parcialmente financiado pelo Programa Brasileiro de Pesquisa Ecológica de Longo Prazo (PELD) do CNPq (Proc.441492 / 2016-9) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Proc. 16 / 2551-0000102-2).

O artigo descreve a dinâmica e avalia a viabilidade da pequena população do golfinho-de-Lahille, estimada em cerca de 90 indivíduos, que utiliza o estuário da Lagoa dos Patos e a costa marinha adjacente. A mortalidade média anual em redes de pesca é de cerca de 5 golfinhos, com variação importante entre os anos. Machos adultos e juvenis/subadultos de ambos os sexos são os grupos mais afetados. Diferentes cenários de mortalidade em artes de pesca foram avaliados a fim de projetar possíveis tendências demográficas e determinar o risco de declínio ao longo de um período de 60 anos (equivalente a 3 gerações desta espécie). Os autores encontraram um prognóstico otimista para os próximos 60 anos, assumindo que a atual taxa de mortalidade acidental nas artes de pesca permanece constante. No entanto, ressaltam a importância das fêmeas maduras para a população, e que a retirada de pelo menos uma delas a cada ano seria o suficiente para desencadear um declínio populacional de até 2,3% ao ano. A viabilidade da população seria substancialmente melhorada se a sobrevivência pudesse ser aumentada.

Isso pode ser alcançado através da área de proteção destes golfinhos recentemente implementada, que proíbe a pesca com redes de emalhar na área central desta população. Se a área de proteção reduzir as taxas de emaranhamento das fases de vida mais impactadas (juvenis/subadultos), haveria uma chance substancial de aumento desta população. Isso é desejável, pois pode promover a conectividade com as populações adjacentes, portanto, o fluxo gênico, o que, por sua vez, aumentaria a diversidade genética e aumentaria a capacidade dos golfinhos-de-Lahille no sul do Brasil enfrentarem os efeitos das mudanças climáticas e potenciais surtos de doenças.